segunda-feira, janeiro 19, 2009

Foge, Élie!

Saímos sem fechar a porta à chave.
A mamã chorava.
Era uma manhã de Junho, mesmo antes do fim das aulas.
Eu estava a jogar às damas com bocadinhos de pão, nos quadrados do oleado da cozinha.
O Sr. Perrier, o nosso vizinho que era polícia, veio bater à porta.
Sussurrou qualquer coisa ao meu pai.
Escutei: «Ralph… Yves».
Não conhecia ninguém com esses nomes.
O meu nome é Élie.
A mamã fez-me meter algumas roupas à pressa na pasta. Meti também o livro de Robinson Crusoé que tinham acabado de dar-me quando fiz sete anos.
― Vamos esconder-te no campo e depois vimos buscar-te.
― Depois de quê?
Tive de enfiar o sobretudo por cima da camisa cinzenta. Era quase Verão, estava quente. Percebi que era para que não vissem a estrela amarela que a mamã tinha pregado no dia 9 de Junho, o dia do meu aniversário.
Depois fomos a pé até à estação. Não apanhámos o autocarro. Logo que o comboio saiu de Paris, colei o nariz aos vidros para contar as vacas nos campos.
O papá apertava os dentes. A mamã fungava.
À chegada perguntámos onde era a quinta do Sr. François. No final de um caminho, vimo-lo apoiado num portão ferrugento. Tirou uma beata amarelada da boca.
Não cheirava nada bem.
Eu não queria ficar ali. O papá pôs a mão no meu ombro. A mamã acariciou-me os cabelos:
― Vai ser como nas férias ― disse-me ao ouvido.
Engoli as lágrimas.
Vi uma mulher que empurrava um carrinho de mão ao longo do pântano, e coelhos e patos, como no livro de leitura da escola.
Disfarçadamente, o papá entregou um envelope ao Sr. François.
Antes de partir, a mamã ajoelhou-se diante de mim.
Enquanto falava comigo, estava sempre a levantar a gola do meu sobretudo como se eu tivesse frio.
― Ouve bem, Élie. A partir de agora chamas-te Émile. Émile, estás a ouvir? E o Sr. e a Sra. François vão ser os teus tio e tia. É preciso que te portes bem. Nós voltamos.
Vi-os partir na curva do caminho. Com a pasta às costas, eu já desistira de me mexer.
A Sra. François fez-me entrar em casa. À minha frente, na longa mesa, pousou uma tigela de leite quente. Tinha nata, mas eu não disse nada. A mamã já não estava ali para ma tirar.
Uma mosca esticava as patas na toalha pegajosa. Vi que aqui não ia poder jogar às damas por causa dos horrorosos desenhos de raminhos de flores.
Mais tarde, subi ao sótão para me deitar. Ninguém me deu um beijo de boa-noite. Tinha medo. Chorei durante muito tempo. Por fim, abracei-me ao livro do Robinson e adormeci.
Os cobertores picavam.
Tive um pesadelo. Estava numa ilha deserta. O Sexta-Feira vinha atrás de mim para me matar e eu corria em volta de um pântano lodoso.
De manhã fui acordado por gritos:
― Émile! Émile!
Lembrei-me que era eu. Tinha aulas.
O professor fez logo troça de mim diante dos outros por causa da minha pronúncia parisiense. Depois, fizemos um ditado.
Dei tantos erros que tive de enfiar as orelhas de burro até aos olhos, e a minha folha de ditado foi arrancada e pregada com um alfinete na minha camisa. Quase no mesmo sítio da estrela que a Sra. François tinha descosido a resmungar:
― Este ainda nos vai levar a todos para a prisão!
Nos dias seguintes, fiquei de castigo, sem recreio. Tive de copiar cem vezes:
― Não se escreve “Tens deportar-te bem”; escreve-se “Tens de portar-te bem.”
Em Paris, eu era o primeiro da turma e a minha caneta nunca esborratava.
Depois, chegaram as férias grandes. O papá e a mamã não vieram buscar-me. Durante todo o Verão, dei de beber aos animais e aprendi a levar as vacas até ao prado. A Capucine era a minha preferida. Contava-lhe tudo. Ela tinha um focinho branco e cor-de-rosa, quente e doce. Doce como o Totor, o meu urso, que deixei ficar em Paris.
Tinha lido o Robinson todo e já não tinha medo do Sexta-Feira. Mas, quando regressei às aulas, ainda tinha medo do professor.
Mas tinha sobretudo medo de uma coisa: que fizessem mal ao papá e à mamã, que eles nunca mais pudessem vir buscar-me, que se esquecessem do lugar onde me tinham escondido, que não me reconhecessem porque eu tinha crescido muito.
Até tentei deixar de comer para parar de crescer, mas não consegui. Tinha muita fome. Os François diziam-me sempre que eu comia por quatro, que não tinha sido um bom negócio e que veriam o que fazer porque o envelope em breve ficaria vazio. Riam-se.
Um dia, disseram que a França estava cortada em duas. Noutro dia, também falaram de Ralph e de Yves. Eu rodava a manivela do moinho de café a fingir que era o comboio.
E, depois, deixou de haver café.
Voltou o Inverno. Tinha-me habituado a lavar-me na bomba. A água gelada esguichava na banca de pedra. Havia água quente na torneira do fogão a lenha, mas era reservada para o grande banho de domingo, antes da missa.
Para fazer chichi e o resto, era preciso ir lá fora, para cima do esterco, atrás do celeiro.
― E que ninguém te veja! ― avisara-me o Sr. François.― Despachado como tu és, ainda nos levas a todos presos…
Mas ele não se preocupava nada.
Ao ver o meu espanto, a Sra. François acrescentou:
― É como com a estrela, quando chegaste cá a casa; tem a ver com a guerra…
Não percebia nada. Ainda não tinha feito oito anos.
Foi nessa altura que me apercebi que a velha vizinha dos François me andava a espiar. Aproveitava para o fazer enquanto lavava os bidões de leite antes da ordenha.
Um dia, fez-me sinal com o dedo adunco para que me aproximasse da cancela.
― Então, menino, esqueceram-se de ti na arrecadação? Os teus pais perderam a tua morada? Nem toda a gente a perdeu… Vais ver o que te espera!
Fugi a correr, cheio de medo. Tinha percebido que ela queria cortar-me qualquer coisa, mas não sabia o quê…
À noite, chamei pela mamã e pelo papá no meu colchão de palha. Só o Tommy, um cão da aldeia, me fez uma visita.
Um dia, vi a Mariette, a neta dela, que parecia má como uma bruxa. Tinha um canivete na mão. Pensei que tinha sido mandada pela avó para me matar, mas ela só queria brincar comigo. Achei-a bonita, com o seu laço vermelho nos cabelos.
Talvez estivesse escondida como eu e não pudesse dizê-lo. Talvez pertencesse à família deles e fosse simpática.
Decidimos brincar os dois.
No entanto, na aldeia, nunca nos tínhamos falado.
Construímos uma cabana. As paredes estavam atapetadas com jornais. A mesa era feita com toros de madeira, a cama com ramos.
Brincámos aos casamentos. Eu era o seu rei, ela a minha rainha.
Fizemos coroas. Mariette era um pouco maior do que eu, mas assegurava-me que não fazia mal, que nos casaríamos para sempre quando tivéssemos idade e a guerra acabasse.
Eu disse que sim. Tinha acabado de fazer oito anos.
Depois veio um Verão e um outro Inverno. A Mariette e eu brincávamos sempre juntos.
Em Abril, ela disse-me que tinha um segredo. Mas que não tinha o direito de mo contar por causa da avó.
― Eu também tenho um grande segredo.
Tinha muita vontade de lhe contar tudo: o falso Émile, a estrela amarela cosida e descosida, os François e o envelope, e os meus pais que me tinham abandonado havia já dois anos.
Nessa quarta-feira tínhamos decidido brincar aos casamentos-quase-de-verdade na igreja, depois da escola. Tinha posto à Mariette uma coroa de papoilas. Entrámos dando as mãos. Numa mancha de luz vimos a avó a rezar. Levantou a cabeça e pregou os dois olhos no meio da minha fronte.
Depressa, a Mariette puxou-me para fora. Ria como uma louca e tinha vontade de fazer chichi. ― Também eu ― disse-lhe. Fomos para trás da igreja. Ríamos, eu de pé, ela agachada.
De repente, olhou-me com um ar estranho. Levantou-se, puxou as cuecas e, a tartamudear qualquer coisa, partiu como uma flecha deixando-me sozinho. Apertei a carcela e fui para casa.
Depois do jantar e da louça, voltei a sair, enquanto os François ouviam as notícias na rádio.
Perto da cavalariça, por detrás do trigo, vi a mãe da Mariette a estender a roupa. Pedi para a ver e a mãe pôs-se a gritar:
― Não há mais Mariette! Acabou-se a Mariette! Chispa daqui! E não te chegues a ela, senão…
Fez um gesto com as mãos como se estivesse a degolar um frango.
― Ala! Como os teus pais! Como os da tua laia!
As molas caíram na relva. Corri para bem longe.
A noite caiu. Corri até mais não poder. Não queria voltar à quinta. Queria encontrar o papá e a mamã. Naquele instante.
Perto da estação, passei ao lado da casa grande, aquela onde diziam que havia todo o ano uma espécie de colónia de férias para crianças. O Tommy, o cão deles, apareceu. Tinha- me encolhido nos arbustos. Ele lambeu-me os braços e as pernas.
Eu estava todo arranhado.
Fui acordado por dois camiões.
Era de manhã.
No fosso onde me encontrava, vi tudo: os polícias e os soldados alemães com as suas armas.
Não me mexi nem respirei. Era óbvio que me vinham buscar. Alguém de casa da Mariette deveria ter-me denunciado, ou então, tinham sido os François, por causa do envelope que estava vazio.
Os ramos do pilriteiro estavam a arranhar-me.
Mas os polícias apontaram para a casa grande e entraram pelo terraço com os soldados. De espingarda em punho, fizeram sair todas as crianças em pijama, mesmo as mais pequeninas, que choravam. Atiraram-nas para os camiões, amontoaram-nas aos gritos de Schnell! Schnell!
Ouvi gritar:
― Liane, Liane, volta!
Foi então que vi a pequena, esbaforida por ter atravessado o prado. Quando me viu, teve medo. De pé, por detrás do arame farpado, permanecia imóvel.
― Salta! ― disse-lhe. ― Chamo-me Élie.
Nesse momento chegou o Tommy, todo contente, a uivar. Pensava que estávamos a jogar às escondidas. Não queria calar-se.
― Anda, salta, Liane!
― Não consigo. Foge, Élie!
Não tive tempo de a ajudar. O barulho das botas aproximou-se.
― Não, o miúdo não ― disse o polícia. ― É o Émile, o sobrinho dos François. É da aldeia.
Então, o soldado pegou na pequena pelo braço. A Liane gritava, não queria, defendia-se com todas as suas pequenas forças.
― Tu, volta para a quinta. Mexe-te ― mandou o polícia.
Alguns minutos mais tarde, os dois camiões cheios de crianças passaram por mim na descida. Deixaram uma nuvem de pó. Ouviam-se choros e cânticos através das coberturas fechadas dos camiões.
Sei que a Liane desapareceu para sempre no grande ventre da guerra. Partiram todos. Sim, sei-o. Compreendo. Estou quase a fazer nove anos.
Continuo à espera.
Será que a mamã virá coser-me uma estrela nova para o meu aniversário?



Élisabeth Brami; Bernard Jeunet
Sauve-toi Élie !
Paris, Seuil Jeunesse, 2003

Para a Liane Krochmal, comboio 71.
Para a Liliane,
Para o Pierre,
Para o Philippe,
que nunca cresceram verdadeiramente.

Para todas as crianças escondidas
e aquelas que não tiveram a sorte
de o ser.

domingo, janeiro 04, 2009

Gebalis

Empresa municipal gere bairros sociais da capital
Gebalis pede indemnização de 5,9 milhões a ex-gestores
02.01.2009 - 11h54
Por PÚBLICO
A actual gestão da empresa municipal Gebalis, que gere os bairros municipais de Lisboa, pede uma indemnização de 5,9 milhões de euros aos ex-gestores Francisco Ribeiro, Mário Peças e Clara Costa, por danos patrimoniais. Os ex-gestores, já acusados de peculato e administração danosa noutro processo, são agora acusados de “usar dinheiro público a seu bel-prazer”.

Segundo a edição de hoje do “Correio da Manhã”, a actual gestão da empresa municipal culpa os anteriores responsáveis de gestão danosa e de terem sido os culpados pelo mau nome a que a empresa está actualmente votada.

Segundo a acção judicial, os envolvidos saberiam do estado deficitário da empresa, mas não se inibiram de gastar dinheiro da instituição consigo próprios ou com pessoas do seu convívio pessoal.

Segundo o jornal, a administração da Gebalis terá gasto, entre Março de 2006 e Outubro de 2007, mais de 64 mil euros com cartões de crédito. Mário peças terá gasto 40 mil euros só em refeições, sendo que do rol de restaurantes por onde o ex-responsável passou estão alguns dos mais luxuosos de Lisboa, Londres e do Brasil.

quinta-feira, janeiro 01, 2009

Convites enviados

Enviei uma série de convites para participarem como colaboradores neste blog. Algumas das pessoas não terão experiencia anterior destas andanças. É fácil, podem crer, mesmo para info excluidos - como eu!. Basta ter alguma abertura para perguntar e eu posso ajudar a dar aqueles passos iniciais mais repelentes (com por exemplo inscrever-se no blogger). Feito isso isto é de uma simplicidade absoluta e muito eficaz na columunicação entre pessoas. Quem se dá ao trabalho de tentar?

As novas cidades


"As cidades mundiais são, simultaneamente, lugares de grande progresso e profunda privação. As áreas rurais sempre foram a mais conhecida face da pobreza. Mas, a pobreza urbana pode ser, simplesmente, tão mais intensa, desumana e ameaçadora para a vida"

Kofi Annan, Secretário-Geral das Nações Unidas entre 1997 e 2007

Fotografia: Moradores de rua de Daca, Bangladesh. Foto: Manoocher Deghati

......................

Pela primeira vez na história, vivemos em um mundo predominantemente urbano, com mais de 50% da população do planeta vivendo em cidades. Embora sejam grandes centros de produção de riqueza e cultura, as megalópoles crescem, cada vez mais, no chamado terceiro-mundo. Entre a população urbana da África, 72% vivem em favelas. Na Ásia, a proporção de pobres é menor, mas ultrapasa o continente africano em números absolutos.
Como mostra Megacidades, a região metropolitana de Mumbai, maior cidade da Índia, que tem favelas tão imensas quanto Dharavi, com 1 milhão de habitantes, ultrapassou a de São Paulo em população e já ocupa a quarta posição no ranking das maiores cidades do mundo, atrás de Tóquio, Nova York e Cidade do México. Em 2025,apenas Tóquio manterá a posição de maior metrópole do mundo. Será seguida por Mumbai, Nova Déli (Índia), onde um em cada quatro habitantes vive em favelas, e Daca (Bangladesh), com 3,4 milhões de pessoas vivendo sem infra-estrutura em 4.966 precários e irregulares assentamentos.
Outro exemplo, trazido pela revista, é Lagos, na Nigéria, onde 70% da população vive abaixo da linha da pobreza, saltará da 22ª posição para a 12ª no ranking das maiores cidades.

UM BILHÃO DE PESSOAS VIVEM EM FAVELAS

Hoje, segundo a ONU, 1 bilhão de pessoas residem em favelas em todo o mundo – 1 em cada 3 moradores de cidades –, 90% delas nos países em desenvolvimento. A urbanização nesses países virou sinônimo de favelização. E a tendência é de alta: a cada ano, essas áreas recebem 27 milhões de habitantes. Isso significa que, quando for cumprida a meta do Desenvolvimento do Milênio das Nações Unidas, de melhorar a qualidade de vida de 100 milhões de favelados até 2015, o mundo terá mais 243 milhões de pessoas morando em aglomerações precárias.
Os dados são de um estudo feito pelo escritório para coordenação de assuntos humanitários (OCHA) e a agência para habitação (UN-Habitat), ambos das Nações Unidas, no fim de 2007, em que antecipavam o fenômeno da pobreza urbana. Foi publicado pela agência IRIN e está disponível para downloud.

(texto de Adriana Carranca)

Um pouco de história

O Banco Mundial (Bird) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) foram criados em julho de 1944, na Conferência de Bretton Woods, com o duplo objectivo de financiar a reconstrução da Europa depois da devastação da Segunda Guerra Mundial e de evitar a ocorrência no futuro de depressões econômicas do tipo da que assolou o mundo capitalista nos anos trinta. Nessa conferência, foi ainda decidida a criação de uma terceira instituição multilateral, a Organização Mundial de Comércio, com o objectivo de regular o comércio internacional, mas esta só veio a ser criada cinquenta anos depois, em 1995.
O FMI tomou a seu cargo a supervisão das políticas macroeconômicas (déficit orçamentário, política monetária, inflação, déficit comercial, dívida externa etc.), a ser acionado em momentos de crise, enquanto o Bird se encarregou das políticas estruturais (políticas públicas, mercado de trabalho, política comercial, alívio da pobreza, etc.). A ajuda ao desenvolvimento com que o BM veio a ser identificado nas décadas seguintes estava pouco presente no mandato inicial, uma vez que os países que mais tarde vieram a ser considerados “subdesenvolvidos” ou “em desenvolvimento” eram então colônias, e o seu desenvolvimento era da responsabilidade das potências coloniais européias.
Tanto o Bird como o FMI foram criados sob a égide do pensamento de Keynes, na crença de que os mercados funcionam freqüentemente mal e que as suas falhas devem ser compensadas por uma forte intervenção do Estado na economia (política fiscal, investimento público etc.).
A partir de 1980, com a era de Reagan e Thatcher, deu-se uma mudança radical (que envolveu purgas no Bird) e as duas instituições passaram a ser as grandes missionárias da ideologia da supremacia do mercado e o Estado, antes visto como solução para os problemas econômicos, passou a ser visto como problema, apenas solúvel com a redução do peso do Estado na economia e na sociedade.
Ao mesmo tempo que o Bird e o FMI foram postos a serviço do modelo norte-americano de capitalismo, o Banco Mundial passou a ser visto como uma instituição dependente do Fundo e este, por sua vez, vinculou-se mais e mais às orientações do Departamento do Tesouro dos EUA. Uma receita universal foi então imposta aos países em desenvolvimento: privatização (das empresas públicas, terra, educação, saúde e segurança social), liberalização dos mercados, desregulamentação da economia, precarização do emprego, descaso de preocupações ambientais.
O resultado desastroso desta orientação está hoje à vista: o aumento dramático das desigualdades sociais; muitos países em África, na América Latina e na Ásia, à beira do caos social e político; 1,2 bilhão de pessoas a vivendo com um dólar por dia e 2,8 bilhões vivendo com dois dólares – ou seja, 45% da população mundial nessa situação.
A partir de meados da década de noventa começou a ser notória a tensão entre o Bird e o FMI, com o primeiro desejando preocupar-se com questões “heterodoxas”, como o meio ambiente, a discriminação sexual e a participação democrática, e aproveitar-se dos golpes na arrogância do FMI produzidos pelos vários fracassos das políticas de ajuste estrutural, culminado no colapso da Argentina em 2001.
Paralelamente, os movimentos sociais reunidos no Fórum Social Mundial têm exigido reformas profundas nas duas instituições ou mesmo a sua abolição. Em particular, denunciam a hipocrisia do Bird e do FMI ao imporem a democracia aos países devedores quando elas próprias não são democráticas (47% do poder de voto no Bird pertence à Europa e EUA). Estas críticas têm vindo a encontrar algum eco dentro do próprio Bird e aqui reside uma das razões da indicação de Wolfowitz.
Para os neoconservadores, o Bird é, tal como a ONU, uma organização suspeita porque é vulnerável ao multilateralismo. Só é tolerável se se puder garantir o seu alinhamento incondicional com os interesses estratégicos dos EUA. Esse alinhamento exige uma maior vinculação da estratégia econômica à estratégia militar. Só assim o “terceiro mundo” deixará de sentir-se dividido entre a supremacia militar dos EUA e a supremacia econômica crescentemente atribuída à União Européia e ao euro.
Para isso é fundamental que a ajuda ao desenvolvimento recompense os países “solidários” na luta contra o terrorismo e puna os recalcitrantes. Por outro lado, é necessário preparar a entrada do Bird no Iraque e convertê-la numa política de compensação para a retirada das tropas cada vez mais encurraladas num beco sem saída. É esta a missão de Wolfowitz: a economia é a continuação da guerra por outros meios.
Os movimentos e as ONGs do Fórum Social Mundial que ainda tinham dúvidas sobre o carácter imperialista e destrutivo do Bird e do FMI deixaram de as ter, o que deve traduzir-se em mais forte mobilização para protestar contra estas instituições e para preparar alternativas realistas. A frase à entrada da sede do Bird em Washington, DC, “o nosso sonho é um mundo sem pobreza”, mostra agora a sua verdade cruel: o fim da pobreza será um sonho enquanto existirem instituições como o Bird e o FMI.

Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal)

terça-feira, março 01, 2005

segunda-feira, fevereiro 28, 2005

Portugal Hoje: O Medo de Existir

O livro de José Gil é de Novembro de 2004, mas só agora o pude ler.
É um "ensaio" polémico, que propondo-se abordar o problema das «mentalidades», debruçando-se especificamente sobre alguns traços característicos da «mentalidade portuguesa», enfrenta à partida um conjunto considerável de riscos.
Mas o exercício, realizado por "um dos 25 grandes pensadores de todo o mundo", segundo o Nouvel Observateur, resulta em pleno.

Um olhar sobre alguns dos males paralisantes da «mentalidade portuguesa», objecto do seu estudo, com a apresentação e definição de alguns conceitos-chave ao explorar o papel do «medo» e dos mecanismos de «não-inscrição» e «infantilização» nas dinâmicas da sociedade portuguesa, na «desastrosa» transição entre um «regime autoritário» e uma «sociedade de controlo».

Uma óptima referência e de leitura fácil.

domingo, fevereiro 06, 2005

Copiar é Proibido

Público, 6 de Fevereiro de 2005

Universidade de Helsínquia
não aceita mais alunos do Porto

Por SANDRA SILVA COSTA, Sábado, 05 de Fevereiro de 2005

Uma universidade de Helsínquia decidiu cortar relações institucionais e não receber mais estudantes provenientes da Universidade do Porto (UP) ao abrigo do programa Erasmus, que fomenta o intercâmbio de alunos entre universidades europeias. Tudo porque um aluno da UP foi surpreendido com umas notas relativas à matéria antes do início de um exame. Aconteceu em Dezembro de 2004 e o estudante foi impedido de concluir a disciplina em causa.
A história é relativamente simples. António (nome fictício) preparava-se para iniciar o exame quando o vigilante da prova decidiu recolher os dicionários que os estudantes tinham consigo. "Pegou no meu, um dicionário de Inglês/Português, que estava a cerca de um metro da mesa onde eu estava sentado, e disse-me que mo devolvia no final da prova", contou o aluno ao PÚBLICO.
Quando acabou o exame, António tentou reaver o dicionário, mas sem sucesso. "O vigilante, que por acaso até era um aluno que eu conhecia, informou-me que teria que mostrá-lo ao assistente da disciplina", explicou. Dentro do dicionário, estava "um índice da matéria, uns tópicos", que António anotou à medida que foi estudando para a prova, alega o aluno da UP.
"Mesmo que tivesse intenção de copiar, que acho que foi o que pensaram de mim, nunca teria hipótese de responder ao exame com base naqueles apontamentos", garante António.
Depois do incidente, o estudante enviou um "e-mail" ao assistente da cadeira, pedindo-lhe "para esclarecer a situação". Como resposta, obteve apenas que "o caso iria seguir os procedimentos normais". "Depois ainda lhe telefonei e enviei um segundo 'e-mail', disponibilizando-me para dar todos os esclarecimentos", assegurou António.
A 20 de Dezembro, já depois de ter feito os restantes exames previstos no plano curricular, e a três dias de regressar a Portugal, António recebeu uma carta da universidade, informando-o que durante seis meses não poderia concluir a disciplina e que a instituição havia decidido cortar relações com a UP, não recebendo assim mais estudantes do Porto. A missiva acusava o aluno de mau comportamento durante um exame.
António queixa-se de que uma carta semelhante a esta chegou à UP a 14 de Dezembro, antes de ele próprio ter sido notificado da decisão. O pior mesmo, considera, é que foi "julgado sumariamente", sem ter tido hipótese de se defender. Por este motivo, enviou, a 31 de Janeiro último, uma carta ao reitor da escola finlandesa, a solicitar que o processo seja reaberto. "Pelo menos quero ter direito a defesa", esclareceu.
Francisco Ribeiro da Silva, vice-reitor e provedor do estudante da UP, confirmou ao PÚBLICO que a instituição foi notificada de que a congénere finlandesa pretende não voltar a receber alunos do Porto. "Havia uma relação de intercâmbio prevista para durar entre 2004 e 2006. Se a situação não for revista, o próximo ano lectivo deverá ficar em branco", adiantou.

Copiar é "proibido"

No ano lectivo 2004/05, a UP enviou para a Finlândia 14 estudantes; dois destes foram para universidades de Helsínquia - António é o único aluno do Porto na escola em questão. Em sentido inverso, chegaram da Finlândia sete estudantes, dois dos quais também originários de escolas da capital. Da universidade que decidiu cortar relações com a UP apenas um estudou no Porto.
Francisco Ribeiro da Silva faz questão de sublinhar que António "é um excelente aluno" e que "foi condenado apenas com base num hipotético processo de intenções". Num artigo que escreveu para uma "newsletter" da UP, o provedor do estudante questiona-se se o incidente "terá sido suficientemente grave para levar a um corte nas relações de mobilidade" mas aproveita o caso para lembrar aos alunos que "têm que assumir que a única forma lícita de 'fazer pela vida' é estudar e trabalhar com seriedade e exigência".
No mesmo artigo, Ribeiro da Silva informa que na página da universidade na Internet lê-se, preto no branco, que "cheating is strictly forbidden" - copiar é totalmente proibido.
A UP já escreveu para a congénere finlandesa manifestando a intenção de reatar as relações entre ambas as instituições. "Parece-nos que, de um caso individual como este, não pode haver uma transposição para o plano institucional", comenta Ribeiro da Silva.

quarta-feira, janeiro 26, 2005

Painéis solares serão obrigatórios nos novos prédios sempre que houver condições

Fonte: Público - Última Hora

Governo aprova amanhã pacote sobre eficiência energética dos edifícios
Painéis solares serão obrigatórios nos novos prédios sempre que houver condições
por Ricardo Garcia

Todos os edifícios novos que forem construídos em Portugal deverão obrigatoriamente ter aquecedores solares para a água, sempre que tecnicamente viável, segundo um diploma que está previsto ser aprovado amanhã em Conselho de Ministros.

A medida, destinada a impulsionar o débil crescimento da utilização da energia solar térmica no país, é a principal novidade de um pacote legislativo que vem sendo elaborado há anos, relativo à eficiência energética dos edifícios e à qualidade do ar interior.

A obrigatoriedade do uso de painéis solares foi incluída na revisão do Regulamento das Características de Comportamento Técnico dos Edifícios (RCCTE), que é uma das três peças que compõem o pacote legislativo. "O recurso a sistemas de colectores solares térmicos para aquecimento de água sanitária nos edifícios abrangidos pelo RCCTE é obrigatório sempre que haja uma exposição solar adequada", diz a proposta de diploma.

O RCCTE aplica-se aos edifícios novos de habitação e também aos de serviços que não tenham sistema central de climatização. As suas normas também valem para grandes remodelações de edifícios já existentes.

Na prática, os colectores solares serão obrigatórios em prédios ou moradias cujo telhado esteja genericamente orientado para Sul, desde que não estejam na sombra nas horas de maior insolação. Estas são as condições de "exposição solar adequada" de que fala o diploma. Em alternativa aos painéis para aquecer a água os edifícios podem optar por outras formas renováveis de energia com capacidade equivalente.

A recurso à energia solar é uma das apostas do país para reduzir a dependência energética em relação ao petróleo e para limitar as emissões de dióxido de carbono - um dos gases com efeito de estufa que estão a acelerar o aquecimento da Terra.

O Programa Água Quente Solar, aprovado há cerca de três anos, previa, até 2010, dotar Portugal com um milhão de metros quadrados de painéis solares. Deveriam ser instalados 150 mil metros quadrados por ano - suficiente para as necessidades de água quente de 37 mil famílias de quatro pessoas. O ritmo actual de instalação, porém, é inferior a 10 mil metros quadrados por ano.

A medida do Governo é vista como uma faca de dois gumes pelos próprios defensores do solar. "É bom que isto aconteça, mas é pena que seja no limite, no extremo. São medidas de choque. Era muito melhor que isto fosse feito de forma contrabalanceada", afirma João Farinha Mendes, presidente da Sociedade Portuguesa de Energia Solar. Farinha Mendes cita o exemplo de Espanha, onde a obrigatoriedade foi sendo introduzida aos poucos, ao longo de três anos.

Além do RCCTE, o Governo deverá também aprovar amanhã alterações ao Regulamento dos Sistemas Energéticos e de Climatização de Edifícios. Será criado, ainda, um Sistema Nacional de Certificação Energética, que transpõe parcialmente uma directiva comunitária (ver caixa). Este sistema, bem como as alterações aos regulamentos que dependam da sua entrada em vigor, deverá estar operacional possivelmente em 2006.

segunda-feira, janeiro 17, 2005

36 mil pessoas morrem por ano por razões facilmente evitáveis

DN. Elsa Costa e Silva
Em Portugal, há anualmente cerca de 36 mil mortes evitáveis. Este número, que coloca o País no topo europeu da pior prestação de cuidados de saúde, resulta de um trabalho de investigação que analisou os óbitos de 2001. Assim, 35% da mortalidade precoce (antes dos 65 anos) poderia ter sido evitada, tendo em conta as possibilidades existentes a nível preventivo e curativo. Ou seja, milhares de pessoas poderiam ainda estar vivas caso tivessem tido acesso em tempo útil aos serviços médicos, se tivessem efectuado rastreios disponíveis a coisas tão básicas como hipertensão, colesterol e glicémia ou a patologias que se sabe estarem a aumentar em Portugal, como o cancro do cólon. (…) ler texto completo

sábado, janeiro 15, 2005

A nossa legislação "avançada e pioneira"

No rescaldo do maremoto no Índico— e numa relativamente peripatética histeria do tipo "a seguir somos nós!"—, a RTP organizou um dos seus "Prós e Contras" a propósito do nível de preparação português (do Estado, das instituições, da sociedade e dos cidadãos) para catástrofes naturais daquele tipo.
Pode-se discutir com maior ou menor profundidade as razões que levam às formas de "debater" que pontuam o nosso panorama mediático e isso, em si mesmo, seria uma questão interessante, mas prefiro não me perder nas generalidades estruturais e aproveitar para esta reflexão uma afirmação do Presidente do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC)— afirmação essa muito repetida em vários contextos e para servir vários (des)propósitos—, que defende que o problema português (estava-se a falar da "performance" das infraestuturas e do parque construído em caso de sismo e/ou maremoto) não era um problema da legislação e regulamentação— área em que "somos pioneiros", de tal forma que um dos código europeus está a ser feito tendo por base a nossa experiência—, mas sim um problema ao nível das ferramentas e procedimentos de verificação do cumprimento dessa legislação.
A maior parte dos portugueses nesta altura suspira e pergunta: "e novidades?"
E com razão.

Naquele serão televisivo discutia-se, entre outras coisas, a capacidade da nossa "construção" (estradas, pontes, casas, edifícios públicos, redes de águas e electricidade, etc.) resistir a uma "agressão sísmica" e, quanto a isso, ficámos (mais uma vez) descansados: se depender dos regulamentos e da legislação, não há casa que caia, não há ponte que se desmorone, não há desgraça que nos caia em cima. (A não ser que estejamos a falar da construção do finzinho do século XIX e da primeira metade do século XX, altura em que já nos tínhamos esquecido da destruição de 1755 e ainda não tinham entrado em campo os heróicos regulamentadores do LNEC, honra lhes seja feita).
Mas ninguém que estivesse a assistir àquele serão televisivo tinha ainda obliterado da memória a queda da Ponte de Entre-os-Rios e as subsequentes confirmações de debilidades estruturais em pontes, túneis, viadutos e estradas e estão ainda presentes na nossa memória colectiva as derrocadas em Campanhã, na altura das escavações do Metro ou a desolação da encosta dos Guindais (só me ocorrem desgraças portuenses, desculpem lá o regionalismo), além de vivermos quotidianamente e ao nível doméstico rodeados de exemplos da fraquíssima qualidade da contrução lusa.
Por isso, ninguém consegue conter um sorriso azedo quando ouve falar da nossa legislação "pioneira e avançada", seja na construção, seja na protecção ambiental, seja onde for. Porque ninguém vê forma de segurar casas e pontes com uns quantos fascículos de decretos-lei e regulamentação associada, por muito que a azáfama escriturária produza catrapázios de normas e códigos.
Porque mesmo essas construções de papel se desmoronam quando com elas se tenta erigir um monumento ào nosso pioneirismo (estou a pensar na luta dos Arquitectos pelo direito à profissão, mas é só um exemplo).

Este nosso orgulho provinciano e bacoco na "legislação pioneira e avançada", acompanhado do proverbial encolher de ombros quando toca à real implementação, faz-me pensar sobre a natureza da Lei. E, em jeito de exercício, proporia que existem duas formas essenciais de criar leis (falo de leis, mas estou a pensar em todos os documentos que visam regulamentar a um nível público as várias práticas com impacto social).
Essas duas formas em que penso dizem respeito à natureza da relação entre as práticas vigentes e as práticas propostas pela Lei. De forma simplificada, podemos dizer que, desde os primórdios da História da Humanidade e da História do Direito (a regulação das relações sociais e económicas), as classes dirigentes (religiosas, sociais, económicas e políticas) tomaram a decisão de transformar em Lei mecanismos de dois tipos: regulamentares e correctivos.
No primeiro caso, a Lei resulta da sistematização das boas práticas, impondo a sua normalização. No segundo, a Lei resulta da necessidade de combater as más práticas. Podendo, na forma e na substância ser extremamente próximas, estas duas formas de legislar, naturalmente, têm impactos de tipo diferente e exigências claramente diferentes.
Correndo seriamente o risco de estar a apresentar uma simplificação quase ridícula destes processos (eu preferiria caricatural, mas nem sempre se consegue), diria ainda que uma forma eficaz de avaliar o avanço civilizacional de um Estado (não necessariamente dum povo) é avaliar o peso relativo dos procedimentos regulamentares e correctivos. Por uma razão simples: quanto maior for o carácter regulamentar dos diplomas e decretos, mais próxima é a Lei da realidade e, em grande parte podemos dizer também que a Lei emana das práticas dos cidadãos; o Estado é um estado de cidadãos. Quanto mais procedimentos de tipo correctivo estiverem presentes na vontade do Estado, maior é o fosso entre dirigentes e dirigidos e mais longe estamos do tal conceito do Estado de cidadãos.

Postas assim as coisas, nesta espécie de radicalismo democrata, laxista e demagógico, torna-se difícil fazer a manobra, que me é vital, de dizer que não quero com isto defender um Estado que nivele por baixo as (que devem ser) altas aspirações duma sociedade e duma nação.
Quero apenas reafirmar a minha convicção na dependência absoluta que as sociedades têm da sua capacidade de formar cidadãos.
Assumindo que os tais procedimentos correctivos impostos pelo Estado, sendo muitas vezes necessários, são mecanismos de abstratização da "coisa pública" e levam a uma divergência permanente e inevitável entre dirigentes e dirigidos, acredito, para mal dos meus pecados, que a solução— única e radical— passa por depositar os nossos esforços e a nossa esperança em mecanismos que, formando e qualificando cidadãos, permitam o abandono da lógica correctiva em detrimento duma lógica regulamentar, que seria (quem sabe?) capaz de nos transformar, duma sociedade com "legislação pioneira e avançada" de ombros encolhidos, numa sociedade com uma legislação equilibrada, globalmente empenhada na sua implementação.

Estou convicto que é este um dos "segredos" do progresso civilizacional de nações que invejamos e que esta é uma das batalhas fundamentais da/pela cidadania.

Notícia no Expresso - assinada por Henrique Monteiro, 14 Jan 2005

Uma reforma psicológica

A notícia teve origem num blog, o que não é a primeira vez que acontece e só confirma a crescente importância desta nova fonte informação: o Director Nacional da PSP foi reformado como magistrado depois de uma Junta Médica o ter considerado incapaz para o serviço pelo facto de estar à beira de uma depressão. José Manuel Branquinho Lobo recebe desde então uma pensão no valor de 5320 euros.

Mais tarde, convidado por Santana Lopes para a direcção da PSP, aceitou e juntou à pensão mais um terço do salário que é correspondente a estas funções - 1577 euros. O Director confirmou tudo e com certo humor acrescentou ao «Correio da Manhã»: «Eu até sou maluco por estar a trabalhar na PSP e ganhar um terço do vencimento, quer dizer, com o esforço que faço deveria ganhar a totalidade».

O Director não captou, ou fingiu não entender, a gravidade da sua situação. Pelo contrário, refere que por uma «questão moral» só ganha um terço do salário da PSP. Esquece, porém, que a incapacidade que requereu e lhe foi concedida por uma Junta Médica surge como muito pouco clara. Não é possível que um homem que não tem condições psicológicas para ser Desembargador fique miraculosamente apto para Director da PSP. Não é lícito que um reformado prematuro, por razões de saúde, e que ainda por cima aufere uma pensão magnífica, se apresente de novo ao trabalho e logo em lugar de tão grande responsabilidade. E não é possível que este senhor seja, ainda por cima, comandante de uma Polícia cívica.

Meu Deus! Se isto é normal, terão de ser as pessoas normais a reformar-se imediatamente por loucura…

segunda-feira, janeiro 10, 2005

Para reflectir

No Público de Domingo 9 de Janeiro
Por ANTÓNIO BARRETO

Já Está

Esta semana, o Parlamento foi nomeado. Três cavalheiros, Santana, Sócrates e Portas, nomearam pessoalmente cerca de 80 deputados. Visto de outro modo, mais ou menos 5.000 pessoas dos cinco partidos, reunidas em comissões locais ou nacionais, nomearam 190 deputados, ou seja, a quase totalidade do Parlamento que entra em funções dentro de seis semanas.

...e se pensássemos nesta curiosa realidade....?

sábado, janeiro 08, 2005

Maremoto na Asia

Posted by Hello
SOS Crianças da Ásia da Unicef = CGD - NIB: 003501270002824123054
Médicos do Mundo = BPI - NIB: 001000009444999000170 = CGD - NIB: 003505510000772213032
Missão na Ásia da AMI = BES - NIB: 0007001540000000672
Caritas = CGD - NIB: 003506970063091793082
Apelo da Cruz Vermelha = BPI - NIB: 001000001372227000970

Congresso da Cidadania

1/5/2005 7:34:00 PM
por Lusa

O ministro da República para os Açores, Laborinho Lúcio, defendeu esta quarta-feira a criação de uma associação da sociedade açoriana da cidadania, que permita fomentar o debate nas ilhas sobre os direitos e responsabilidades dos cidadãos

O ministro da República para os Açores, Laborinho Lúcio, defendeu esta quarta-feira a criação de uma associação da sociedade açoriana da cidadania, que permita fomentar o debate nas ilhas sobre os direitos e responsabilidades dos cidadãos.
Em conferência de imprensa, para apresentação do Congresso da Cidadania, que vai decorrer até Maio, Laborinho Lúcio salientou que "o aumento da qualidade cívica só se realiza promovendo a participação das populações em todos os níveis".
"É urgente e fundamental alicerçar-se uma mais rigorosa consciência da autonomia do sujeito cidadão como autor do seu tempo, através de uma intervenção cívica mais empenhada e esclarecida sobre direitos e responsabilidades", alertou o ministro da República.
Laborinho Lúcio reclamou ainda uma maior reflexão e apuramento do sentido crítico, confronto de opinião e de informação, bem como de novos modelos de intervenção através do empenhamento activo dos cidadãos.
O "Congresso da Cidadania - Direitos e Responsabilidades" começa em Ponta Delgada, a 24 deste mês, com a presença do Presidente da República, Jorge Sampaio, e com uma conferência do reitor da Universidade dos Açores sobre "Autonomia, Globalização e Conhecimento".
Até Maio, serão apresentados 25 temas com a participação de 80 personalidades em todos os concelhos da região.
Os temas específicos abordam questões desde a investigação científica ao ambiente, liberdade, segurança, ultraperiferias, exclusão social, património, cultura, família, sociedade, Estado, criança, violência doméstica, educação, desenvolvimento, partidos políticos, justiça administração pública e movimentos sociais.
Entre várias personalidades, está prevista a participação de Victor Feytor Pinto, Roberto Carneiro, Pacheco Pereira, Boaventura Sousa Santos, Manuel Maria Carrilho, José Carlos Vasconcelos, Duarte Lima, António Lobo Xavier, José Magalhães, Medeiros Ferreira e Teresa Patrício Gouveia.
Laborinho Lúcio propôs também aos habitantes dos diversos concelhos dos Açores que apresentem "projectos de adesão", uma forma de participação dos cidadãos através da realização antecipada de diversas iniciativas cujas conclusões serão debatidas nos trabalhos. O Congresso encerra a 14 de Maio, em Angra do Heroísmo, com uma conferência sobre a "Cidadania Europeia numa Europa dos Valores", a proferir pelo antigo comissário europeu António Vitorino

quinta-feira, dezembro 30, 2004

Posted by Hello

O momento de sucesso de uma turista parva, na SIC.

A SIC deu uma reportagem onde entrevistaram portugueses que partiram, depois da tragédia, para a Tailândia, mantendo as ferias marcadas como antes de tudo acontecer.Dulce Ferreira respondeu que já tinha as ferias marcadas, que não tinha ficado nada preocupada com o que tinha acontecido, porque os pais, que lá estavam, tinham enviado uma msg a dizer que tinha havido "uns tsunamis e umas coisas", mas estavam bem.Quando a jornalista lhe perguntou se estava triste com toda a situação Dulce Ferreira respondeu "sim, claro, agora já não vou ter todas ascondições de férias que iria ter se por acaso não tivesse acontecido nada disto. Por outro lado, estou contente, porque vejo as coisas maisao natural, como elas são."Aqui segue a fotografia da turista parva, com os votos que a realidade tailandesa após a catástrofe lhe abra os olhos de menininha burguesa.

segunda-feira, dezembro 27, 2004

Portugal cada vez mais longe da Europa

DESARROLLO-PORTUGAL:
Lejos de Europa

Mario Queiroz

LISBOA, 21 sep (IPS) - Indicadores económicos y sociales periódicamente divulgados por la Unión Europea (UE) colocan a Portugal en niveles de pobreza e injusticia social inadmisibles para un país que integra desde 1986 el ”club de los ricos” del continente.

Pero el golpe de gracia lo dio la evaluación de la Organización para la Cooperación y el Desarrollo Económicos (OCDE): en los próximos años Portugal se distanciará aún más de los países avanzados.

La productividad más baja de la UE, la escasa innovación y vitalidad del sector empresarial, educación y formación profesional deficientes, mal uso de fondos públicos, con gastos excesivos y resultados magros son los datos señalados por el informe anual sobre Portugal de la OCDE, que reúne a 30 países industriales.

A diferencia de España, Grecia e Irlanda (que hicieron también parte del ”grupo de los pobres” de la UE), Portugal no supo aprovechar para su desarrollo los cuantiosos fondos comunitarios que fluyeron sin cesar desde Bruselas durante casi dos décadas, coinciden analistas políticos y económicos.

En 1986, Madrid y Lisboa ingresaron a la entonces Comunidad Económica Europea con índices similares de desarrollo relativo, y sólo una década atrás, Portugal ocupaba un lugar superior al de Grecia e Irlanda en el ranking de la UE. Pero en 2001, fue cómodamente superado por esos dos países, mientras España ya se ubica a poca distancia del promedio del bloque.

”La convergencia de la economía portuguesa con las más avanzadas de la OCE pareció detenerse en los últimos años, dejando una brecha significativa en los ingresos por persona”, afirma la organización.

En el sector privado, ”los bienes de capital no siempre se utilizan o se ubican con eficacia y las nuevas tecnologías no son rápidamente adoptadas”, afirma la OCDE.

”La fuerza laboral portuguesa cuenta con menos educación formal que los trabajadores de otros países de la UE, inclusive los de los nuevos miembros de Europa central y oriental”, señala el documento.

Todos los análisis sobre las cifras invertidas coinciden en que el problema central no está en los montos, sino en los métodos para distribuirlos.

Portugal gasta más que la gran mayoría de los países de la UE en remuneración de empleados públicos respecto de su producto interno bruto, pero no logra mejorar significativamente la calidad y eficiencia de los servicios.

Con más profesores por cantidad de alumnos que la mayor parte de los miembros de la OCDE, tampoco consigue dar una educación y formación profesional competitivas con el resto de los países industrializados.

En los últimos 18 años, Portugal fue el país que recibió más beneficios por habitante en asistencia comunitaria. Sin embargo, tras nueve años de acercarse a los niveles de la UE, en 1995 comenzó a caer y las perspectivas hoy indican mayor distancia.

¿Dónde fueron a parar los fondos comunitarios?, es la pregunta insistente en debates televisados y en columnas de opinión de los principales periódicos del país. La respuesta más frecuente es que el dinero engordó la billetera de quienes ya tenían más.

Los números indican que Portugal es el país de la UE con mayor desigualdad social y con los salarios mínimos y medios más bajos del bloque, al menos hasta el 1 de mayo, cuando éste se amplió de 15 a 25 naciones.

También es el país del bloque en el que los administradores de empresas públicas tienen los sueldos más altos.

El argumento más frecuente de los ejecutivos indica que ”el mercado decide los salarios”. Consultado por IPS, el ex ministro de Obras Públicas (1995-2002) y actual diputado socialista João Cravinho desmintió esta teoría. ”Son los propios administradores quienes fijan sus salarios, cargando las culpas al mercado”, dijo.

En las empresas privadas con participación estatal o en las estatales con accionistas minoritarios privados, ”los ejecutivos fijan sus sueldos astronómicos (algunos llegan a los 90.000 dólares mensuales, incluyendo bonos y regalías) con la complicidad de los accionistas de referencia”, explicó Cravinho.

Estos mismos grandes accionistas, ”son a la vez altos ejecutivos, y todo este sistema, en el fondo, es en desmedro del pequeño accionista, que ve como una gruesa tajada de los lucros va a parar a cuentas bancarias de los directivos”, lamentó el ex ministro.

La crisis económica que estancó el crecimiento portugués en los últimos dos años ”está siendo pagada por las clases menos favorecidas”, dijo.

Esta situación de desigualdad aflora cada día con los ejemplos más variados. El último es el de la crisis del sector automotriz.

Los comerciantes se quejan de una caída de casi 20 por ciento en las ventas de automóviles de baja cilindrada, con precios de entre 15.000 y 20.000 dólares.

Pero los representantes de marcas de lujo como Ferrari, Porsche, Lamborghini, Maserati y Lotus (vehículos que valen más de 200.000 dólares), lamentan no dar abasto a todos los pedidos, ante un aumento de 36 por ciento en la demanda.

Estudios sobre la tradicional industria textil lusa, que fue una de las más modernas y de más calidad del mundo, demuestran su estancamiento, pues sus empresarios no realizaron los necesarios ajustes para actualizarla. Pero la zona norte donde se concentra el sector textil, tiene más autos Ferrari por metro cuadrado que Italia.

Un ejecutivo español de la informática, Javier Felipe, dijo a IPS que según su experiencia con empresarios portugueses, éstos ”están más interesados en la imagen que proyectan que en el resultado de su trabajo”.

Para muchos ”es más importante el automóvil que conducen, el tipo de tarjeta de crédito que pueden lucir al pagar una cuenta o el modelo del teléfono celular, que la eficiencia de su gestión”, dijo Felipe, aclarando que hay excepciones.

”Todo esto va modelando una mentalidad que, a fin de cuentas, afecta al desarrollo de un país”, opinó.

La evasión fiscal impune es otro aspecto que ha castrado inversiones del sector público con potenciales efectos positivos en la superación de la crisis económica y el desempleo, que este año llegó a 7,3 por ciento de la población económicamente activa.

Los únicos contribuyentes a cabalidad de las arcas del Estado son los trabajadores contratados, que descuentan en la fuente laboral. En los últimos dos años, el gobierno decidió cargar la mano fiscal sobre esas cabezas, manteniendo situaciones ”obscenas” y ”escandalosas”, según el economista y comentarista de televisión Antonio Pérez Metello.

”En lugar de anunciar progresos en la recuperación de los impuestos de aquellos que continúan riéndose en la cara del fisco, el gobierno (conservador) decide sacar una tajada aun mayor de esos que ya pagan lo que es debido, y deja incólume la nebulosa de los fugitivos fiscales, sin coherencia ideológica, sin visión de futuro”, criticó Metello.

La prueba está explicada en una columna de opinión de José Vitor Malheiros, aparecida este martes en el diario Público de Lisboa, que fustiga la falta de honestidad en la declaración de impuestos de los llamados profesionales liberales.

Según esos documentos entregados al fisco, médicos y dentistas declararon ingresos anuales promedio de 17.680 euros (21.750 dólares), los abogados de 10.864 (13.365 dólares), los arquitectos de 9.277 (11.410 dólares) y los ingenieros de 8.382 (10.310 dólares).

Estos números indican que por cada seis euros que pagan al fisco, ”le roban nueve a la comunidad”, pues estos profesionales no dependientes deberían contribuir con 15 por ciento del total del impuesto al ingreso por trabajo singular y sólo tributan seis por ciento, dijo Malheiros.

Con la devolución de impuestos al cerrar un ejercicio fiscal, éstos ”roban más de lo que pagan, como si un carnicero nos vendiese 400 gramos de bife y nos hiciese pagar un kilogramo, y existen 180.000 de estos profesionales liberales que, en promedio, nos roban 600 gramos por kilo”, comentó con sarcasmo.
Si un país ”permite que un profesional liberal con dos casas y dos automóviles de lujo declare ingresos de 600 euros (738 dólares) por mes, año tras año, sin ser cuestionado en lo más mínimo por el fisco, y encima recibe un subsidio del Estado para ayudar a pagar el colegio privado de sus hijos, significa que el sistema no tiene ninguna moralidad”, sentenció.(FIN/2004)

sexta-feira, dezembro 17, 2004

Natal dos consumidores

O absurdo da oferta de presentes de Natal sem qualquer significado


A quase obrigação de oferecer, mecânicamente, pelo Natal, presentes aos amigos e familiares, em especial às crianças, tornou-se pela sua dimensão e ausência de real significado afectivo um enorme absurdo da nossa sociedade de consumo.
Esta situação decorre, em grande parte, dos intereses económicos da produção e do crescente impessoalismo das relações sociais, que levam a redimir pela compra as lacunas de outros valores humanos do relacionamento.
Reflita, nesta quadra especial, sobre o consumismo galopante da nossa civilização. Não compre qualquer coisa apenas por comprar.
Ofereça algo que tenha significado: um objecto usado, um desenho, um texto, um bolo, umas bolachinhas caseiras ou uma travessa de rabanadas!
Contribua para construir um Natal com afecto e com menos consumo. A sustentabilidade da sociedade, do ambiente e do mundo agradecem.
Seja responsável, consuma com moderação e tenha um Bom Natal!

Na Noruega

Na Noruega, o horário de trabalho começa cedo (às 8 horas) e acaba cedo (às 15.30). As mães e os pais noruegueses têm uma parte significativa dos seus dias para serem pais, para proporcionar aos filhos algo mais do que um serão de televisão ou videojogos. Têm um ano de licença de paternidade e nunca ouviram falar de despedimentos por gravidez.
A riqueza que produzem nos seus trabalhos garante-lhes o maior nível salarial da Europa. Que é também, desculpem-me os menos sensíveis ao argumento, o mais igualitário. Todos descontam um IRS limpo e transparente que não é depois desbaratado em rotundas e estatuária kitsh, nem em auto-estradas (só têm 200 quilómetros dessas «alavancas de progresso», nem em Expos e Euros.
É tempo dos empresários portugueses constatarem que, na Noruega, a fuga ao fisco não é uma «vantagem competitiva». Ali, o cruzamento de dados «devassa» as contas bancárias, as apólices de seguros, as propriedades móveis e imóveis e as «ofertas» de património a familiares que, em Portugal,país de gentes inventivas, garantem anonimato aos crimes e «confundem» os poucos olhos que se dedicam ao combate à fraude económica.
Mais do que os costumeiros «bons negócios», deviam os empresários portugueses pôr os olhos naquilo que a Noruega tem para nos ensinar.
E, já agora, os políticos. Numa crónica inspirada, o correspondente da TSF naquele país, afiança que os ministros não se medem pelas gravatas nem pela alta cilindrada das suas frotas. Pelo contrário, andam de metro, e não se ofendem quando os tratam por tu.
Aqui, cada ministério faz uso de dezenas de carros topo de gama, comvidros fumados para não dar lastro às ideias de transparência dos cidadãos.
Os ministros portugueses fazem-se preceder de batedores motorizados, poluem o ambiente, dão maus exemplos e gastam a rodos o dinheiro que escasseia para assuntos verdadeiramente importantes.
Mais: os noruegueses sabem que não se «projecta o nome do país» com despesismos faraónicos, basta ser-se sensato e fazer da gestão das contas públicas um exercício de ética e responsabilidade. Arafat e Rabin assinaram um tratado de paz em Oslo. E, que se saiba, não foi preciso desbaratarem milhões de contos para que o nome da capital norueguesa corresse mundo por uma boa causa.
Até os clubes de futebol noruegueses, que pedem meças aos seus congéneres lusos em competições internacionais, nunca precisaram de pagar aos seus jogadores quatrocentos salários mínimos por mês para que estes joguem à bola.
Nas gélidas terras dos vikings conheci empresários portugueses que ali montaram negócios florescentes. Um deles, isolado numa ilha acima do círculo polar Árctico, deixava elogios rasgados à «social-democracia nórdica». Ao tempo para viver e à segurança social clamam por messias nem por prebendas. Não se queixam do «excessivo peso do Estado, para depois exigirem isenções e subsídios.
É tempo de aprendermos que os bárbaros somos nós. Seria meio caminho andado para nos civilizarmos.